Acordei no céu
Era uma bela noite. Aquele clima bom de outono, nenhuma nuvem no céu. Ótima oportunidade para mais uma noitada. Tomei um belo banho, vesti minha melhor roupa, liguei para os amigos e peguei o carro.
Estava muito animado, aumentei o som do carro no último volume e acelerei até perceber, subitamente, que já ia aos 200 quilômetros por hora. Melhor ainda, assim chegaria mais rápido, pensei.
A noite foi muito boa, como sempre. Eu cometia o proibido, o que me fortalecia e me fazia sentir poderoso, e nada me acontecia. Isso me fazia sentir um super heroi dos tempos atuais. Tudo naquela noite, como sempre, estava rodeado de álcool, azaração e muita música.
Já pela madrugada, resolvi ir embora. Estava cedo e era fim de semana, mas umas horas a mais ou a menos não fariam diferença. Uma pessoa em sã consciência pegaria um taxi, mas ali nem havia bafômetro, então eu não via motivos.
Arranquei à toda velocidade, e lembrei-me de como era bom quebrar as regras. Tudo pra mim era natural e não incluía nenhum perigo, inclusive ultrapassar o sinal vermelho.
Foi numa dessas ultrapassagens, aliás, na ultrapassagem daquela noite, que tudo aconteceu. Quando dei por mim, já estava há menos de um metro do poste que me levaria a um lugar que eu nem acreditava existir: o céu.
Ao contrário da tradicional imagem de um lugar azul sobre as nuvens, o céu era muito semelhante à o que, na terra, chamaríamos de hotel 5 estrelas. Na recepção, havia um homem grisalho e barbudo, com vestes em tom de nude e azul, e algumas chaves na mão.
Logo fui interrogado: “Qual o nome do réu?”, e respondi “Tarcísio Freitas”, temendo o veredito. “Dossiê de Tarcísio Freitas, por favor”, declarou o homem, ao estalar os dedos.
Apareceram então criaturas que eu supunha ser anjos, mesmo sem asas ou auréolas. “Aqui está, São Pedro”, declararam.
Claro, São Pedro! Como eu não tinha pensado nisso antes? Seria julgado por aquele que possuía a chave dos céus, o manda chuva.
Começou a analisar meu dossiê. “Hm, porte de drogas, noitadas, exagero no álcool, descumprimento de regras... Como eu imaginava. Entrada negada.” O que? Eu não poderia entrar no céu? Não era possível. Haveria um jeito de concertar aquilo.
“Não posso recorrer diretamente à Deus?”. Em pensar que há minutos atrás eu nem acreditava em sua existência. Então São Pedro puxou o interfone e chamou: “Senhor Juiz, poderia comparecer à recepção?”. Senhor Juiz. Então era assim que eles chamavam Deus por ali. “Ele já está descendo”, falou.
Após alguns minutos, percebi uma luz estranha na porta do elevador. Olhei para o lado, e a porta se abriu, mostrando a imagem de um cara que eu nunca diria ser Deus, pois estava mais para criador do “Facebook”. Jovem, rosto sereno, roupa social e ao mesmo tempo descolada. Então aquele era o tão famoso Deus.
“Qual o problema desta vez, Pedro?”, Deus falou, e logo foi respondido: “este energúmeno deseja entrar ao céu, veja só que absurdo”. Tentei me defender: “mas Senhor, ouça ao menos meu pedido de desculpas e declaração de arrependimento”. “Arrependimento... na hora que o cinto aperta, todo mundo se arrepende”, riu São Pedro.
“Pedro, você está aqui para interceder, e não para decidir ou julgar. Ponha-se no seu lugar”. “Desculpa, só estava tentando ajudar”, disse São Pedro, cabisbaixo. “Querido Tarcísio, desculpe-me, mas não posso conceder a entrada a quem não vejo estar arrependido de coração. Realmente terei de negar sua entrada. Dê-lhe as informações, Pedro”. “O inferno fica no próximo quarteirão, à direita, número 666”. A única coisa que pude dizer foi um mero “obrigado”.
Me dirigi ao tão temido lugar, que a princípio não parecia nada assustador. Era um lugar aconchegante e atraente. Era. Até que comecei a sentir um calor, e percebi o fogo queimando meus pés. Dei-me conta de que não podia domá-lo, e ele foi tomando conta das minhas pernas, foi subindo... até que me desesperei: minhas nádegas estavam em chamas!
Acordei subitamente, com um susto. Olhei para baixo: nada queimava. Estava bastante suado e então notei que havia pegado no sono enquanto lia “Cristal na Veia”, durante uma bela noite de outono...
Izabella Baldoíno Almeida, estudante da 1ª série do Colégio Olagarina Pintangueira, Coité - Ba.
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